quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Uma questão de sorte


O filme "Boa Noite Boa Sorte" dirigido por George Clooney levanta perguntas importantes num momento em que parece que tais não foram ainda assimiladas pelos detentores dos meios de comunicação de massa. A era da informação vive seu momento de questionamento sobre a liberdade de e acesso irrestrito à informação e de pensamento.

O ponto principal do filme é o papel de Edward Murow e suas críticas ao senador McCarthy, este apontado por Murrow como o homem “caçador de bruxas” (“caça às bruxas” ficou conhecida como o momento em que a política norte-americana da década de 50 perseguia veementemente os suspeitos de comunismo). Questionado também sobre os métodos pelos quais McCarthy ousou perseguir tais suspeitos.

A fotografia em preto e branco foi perfeitamente aplicada para reforçar o tom sóbrio e até boêmio do filme, principalmente nos momentos em que uma cantora negra entrava entre algumas cenas para disparar um vozeirão e deixar esta película com o mesmo charme com que Murrow aparecia com seu cigarro para fazer suas críticas.

Tecendo uma análise do ponto de comunicador de rádio e tv observo uma cenografia perfeita e a ausência de trilha sonora em boa parte do filme exibe a intenção do diretor em transportar o expectador à uma introspecção reflexiva por este se questionar se em algum momento já calou a voz de alguém ousado a discordar de seus devaneios narcísicos.

“Boa Noite, Boa Sorte” vai além de uma análise sobre sua produção indicada a vários prêmios no ano do vencedor “O Segredo de Brokeback Mountain”. Trata-se de uma obra atual pois há muitos vestígios dessa caçada a liberdade de expressão nos momentos recentes não só nos Estados Unidos. Mas também no território brasileiro onde o Jornal Estado S. Paulo foi proibido de noticiar escândalos de corrupção envolvendo o sobrenome Sarney. Igualmente atual pois até hoje discute-se o papel da imprensa e dos meios de comunicação escrita e áudio-visual. Na terra do Tio Sam a Fox teve seu jornalismo questionado ao falar de Barack Obama.

O uso da liberdade de imprensa causou transtornos não só ao Estadão, mas – voltando ao filme – Murrow teve de mudar de horário e de dia de exibição do seu “See it Now”, programa exibido no horário máximo da audiência americana, para as tardes de domingo.

Por enquanto a internet ainda parece estar ilesa dessa vigilância. Talvez o seu alcance ainda limitado e sua dificuldade em fiscalizar seu conteúdo tivessem ainda distantes do exemplo panóptico de Foucault. Ainda veremos no entanto alguém para tentar castrar os dedos de algum Murrow da era digital. Só resta esperar que final uma futura história de censura isso vai ter.

No caso de “Boa noite boa sorte” houve um happy ending colocando McCarthy contra sua própria língua e seus métodos de perseguição aos comunistas foram postos em cheque no senado americano.

Depois da caça as bruxas o que parece ter surtido efeito é que as denúncias do jornalismo investigativo tiveram que mudar sua estética, tirando do jornalista formador de opinião para os talking heads que só fazem é retransmitir o que fora escrito previamente por um redator.

Embora não tenha realmente uma ligação direta com o comunismo e os ideais de Karl Marx, Murrow aplica de uma certa forma a teoria frankfurtiana ao levantar a real função da mídia na sociedade em vez de simplesmente analisar a mensagem – em oposição a teoria funcionalista. Abre-se também o espaço para discussões sobre a temática e do impacto de uma forma sutil de censura pelo simples fato de um líder de audiência tenha que mudar sua posição numa grade numa emissora e das demissões de vários funcionários da CBS justamente com seu programa de maior prestígio.

Até o momento atual a pergunta de Murrow sobre o papel da televisão parece ainda não ter resposta. Talvez esteja nos bastidores da CBS e seu exemplo a nossa luz no fim do túnel ou então este segundo comece na Colômbia de Hugo Chavez. Quiçá no Maranhão...

É, vivemos num mundo globalizado, definitivamente.

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